28 de outubro de 2022

"Pintou um clima, pintou um crime". Rede Intersetorial de São Sebastião cobra providências ao poder público sobre o caso das adolescentes venezuelanas expostas pelo presidente da República


Manifesto conta com a assinatura de 72 membros da Rede e foi encaminhado aos órgãos de defesa dos direitos da Criança e do Adolescente, entre eles o Ministério Público, além dos conselhos de Psicologia e Serviço Social, e as comissões de Direitos Humanos da Câmara Federal, do Senado e da Câmara Legislativa do Distrito Federal.

 

                           Foto: Debora Diniz. Reprodução.


Nesta semana, a Rede Intersetorial de São Sebastião se posicionou formalmente por meio de manifesto sobre as declarações dadas pelo Presidente da República e candidato à reeleição em entrevista a um podcast, no dia 14 de outubro deste ano. O mandatário se referiu a uma visita que fez a adolescentes venezuelanas, em abril de 2021, no Setor Habitacional Morro da Cruz, insinuando que ali haveria, à época, exploração sexual de crianças e adolescentes.

Lideranças venezuelanas rechaçaram a fala do presidente e reafirmaram que na ocasião da visita acontecia uma ação social para oferta de curso de estética com a participação de mulheres venezuelanas e pessoas da comunidade.

Segundo declarações do próprio Presidente, naquela ocasião, “pintou um clima”, antes de pedir para adentrar a casa delas. “Eu parei a moto em uma esquina, tirei o capacete e olhei umas menininhas, 3, 4, bonitas, de 14, 15 anos, arrumadinhas em um sábado numa comunidade. E vi que eram meio parecidas. Pintou um clima, voltei. ‘Posso entrar na sua casa?’. Entrei. Tinham umas 15, 20 meninas, sábado de manhã, se arrumando. Todas venezuelanas. E eu pergunto: meninas bonitinhas de 14, 15 anos se arrumando no sábado para quê? Ganhar a vida”, diz Jair Bolsonaro, em trecho da entrevista.

"Nesse dia, tivemos uma ação que acontecia na casa. Uma brasileira que promovia curso de estética vinha até aqui para colocar em prática o que estava aprendendo, de corte de cabelo, design de sobrancelha. Então, organizamos um grupo de mulheres para participarem dessa ação. Foi apenas isso!", afirma uma liderança venezuelana, que preferiu não se identificar por medo de represálias.

Em reunião extraordinária, convocada no dia 17 de outubro para discutir exclusivamente o assunto, diversos membros da Rede Intersetorial manifestaram preocupação com o teor das falas do Chefe de Estado, sobretudo com a naturalização de um possível contexto de violação aos direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente, além da exposição a que foram submetidas as adolescentes venezuelanas por integrantes do alto escalão do governo.

Em um trecho do manifesto, que conta com 72 assinaturas, membros da Rede afirmam que "as insinuações são gravíssimas e sem qualquer fundamento. Ainda que procedessem no sentido de apontar fielmente que ali haveria a prática criminosa de violência e/ou exploração sexual de crianças e adolescentes –, caberia questionarmos: i) com base em que evidências o mandatário afirmou que a casa visitada à época dos fatos seria local de prostituição? ii) quais providências foram adotadas de imediato pelo Chefe do Poder Executivo para apurar e cessar a possível situação de violação de direitos das adolescentes? iii) por que o Presidente trouxe o assunto à baila somente agora, decorrido tanto tempo do suposto episódio?".

Cientes do papel fundamental da Rede enquanto organização comunitária e articulação entre as entidades da Sociedade Civil Organizada e órgãos governamentais de São Sebastião e Distrito Federal, os participantes da reunião decidiram encaminhar o manifesto aos órgãos de defesa dos direitos da Criança e do Adolescente, entre eles o Ministério Público, além dos conselhos de Psicologia e Serviço Social, e as comissões de Direitos Humanos da Câmara e do Senado e da Câmara Legislativa do Distrito Federal, solicitando a adoção das seguintes providências:

1-      Seja o Ministério Público do Distrito Federal e Território acionado para a adoção das medidas que julgar pertinentes, incluindo a apuração das devidas responsabilizações, e a requisição de informações à Embaixada da Venezuela para tomar ciência das ações adotadas pelo consulado diante da situação das adolescentes venezuelanas, bem como que sejam discutidas medidas conjuntas, entre as quais a realização de diligência na cidade de São Sebastião, bem como para avaliar possível cometimento de conduta criminosa pelo Presidente da República;

2  – Seja disponibilizado serviço de apoio psicológico para as adolescentes, em parceria com a Rede e com o Conselho Regional de Psicologia, além de outras entidades parceiras, como Universidade de Brasília e Associação Brasileira de Psicologia – ABP;

3    – Articulação por meio do Conselho Tutelar, do CREAS e do CRAS, visando à inserção das adolescentes, com prioridade, no Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), de forma pactuada com as vítimas e suas famílias;

4  – Articulação, por meio da Embaixada da Venezuela e organizações da sociedade civil que trabalham na promoção de apoio e proteção às pessoas migrantes e refugiadas daquele país, no sentido de conjugar esforços e ações para combater e sanar a xenofobia, discriminação e perseguição política que a comunidade venezuelana em São Sebastião vivencia;

5     – Adoção de medidas visando preservar a imagem, segurança e integridade das adolescentes e lideranças venezuelanas, garantindo-lhes proteção integral, impedindo, inclusive, que a Presidência da República faça uso político-eleitoral da situação em tela; 

6    – Demais ações julgadas cabíveis com o fim de combater e sanar questões como xenofobia, discriminação, estigmatização, assédio, violência e exploração sexual em nosso país.

Ao final do documento, a Rede reitera o seu posicionamento público e repudia a postura de Jair Bolsonaro. O coletivo reafirma o seu compromisso com a promoção, defesa e proteção dos direitos de Crianças e Adolescentes como prioridade absoluta e reforça a necessidade da adoção de providências para a firme observância aos dispositivos do ECA. 

Cobra, ainda, respeito aos direitos e garantias fundamentais, destinados a todos os cidadãos brasileiros e estrangeiros. E conclui: "Afinal, proteger meninos e meninas é dever de todos nós!"

Para acessar o manifesto da Rede, clique no link:

.https://drive.google.com/file/d/18TydWo_Zt27lzd_6NUhUq_Uk_iadxGao/view?usp=sharing

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