26 de julho de 2011

A medida da poesia ou a filosofia do fazer poético


Nem todo questionamento é filosófico
E nem tudo que rima é poesia
Rima pobre
Rima rica
Rima preciosa ou rara
Interna ou externa
Emparelhada ou interpolada
Tantas são as rimas que perdemos a medida certa


E eis um punhado de palavras soltas
Muito bem ordenadas e dispostas
Ao sabor de uma vã sonoridade
Ou à vontade de caprichos e fetiches
De amores juvenis
Aventuras e desventuras
De um ser qualquer infeliz

Palavras vivas de notável eruditismo
Bem compostas, retocadas aqui e ali
Servidas à mesa em pratos muito finos
Bem ao gosto dos fatigáveis salões burgueses
Ao eco seco do tamborilar de dedos à mesa
E aos burburinhos que pairam risonhos
Numa clara ostentação
De glamour e requinte

Mas, quando postas à balança
É que se tem a exata medida do que dizem:
Impossível esconder tamanha arrogância
De palavras, por vezes, cruas e vazias
Que pouco ou nada dizem.
Palavras que mais molestam os fatigados ânimos
E aborrecem os ouvidos,
Frases intoxicadas pelo elevado teor
Do ranço de tempos remotos que não cabem mais em si

Pois que fiquem sabendo os sofistas, os céticos
E todos os que querem enquadrar
E matematizar a livre e manifesta expressão da palavra:
Que não existe regra nem padrão
Que abarquem e definam por completo
O verdadeiro fazer poético.

Pois que a poesia nua e pura
É filha primeira e legítima da emoção que brota
Ardente e sedenta por materializar-se
Pela palavra simples e inteligível
Perante os olhos da razão e à alma do coração.

Todavia, um complexo emaranhado se revela
Linguagem carregada de significação
A extravasar dor, alegria, antíteses e antídotos
Até o mais profundo grau possível
Força que nos toca, paralisa e emociona diante da vida
Para levar ao coração
– canal de sentimentos e pensamentos enigmáticos –
A sugestão e a possibilidade
De brindarmos a vida e brincarmos de ser criadores
De realidades possíveis, concretas ou surreais.

Os cientistas, os físicos e matemáticos
Deveriam saber muito bem que
Não há dimensão nem medida calculável
Nem ponderação ou sobriedade
Muito menos a tal objetividade
Quando desejamos tratar das coisas e fenômenos
Cujo terreno seja de domínio da emoção

Pois o pensamento supera
O infinitamente pensável
-Meu sentimento é do tamanho do mundo!
Em minhas águas aparentemente calmas
Me pego a digladiar interminavelmente
Contra feras indomáveis
Monstros tenebrosos saídos
Na calada da noite
Do fundo do mar bravio -
Furacão doido, tempestuoso – sorvedouro implacável
De dia, águas mansas, à noite, mar inavegável

Minha emoção não se faz prisioneira, portanto,
Das correntes do Formalismo Russo
Ou dos preceitos mais sagrados
Ditados pela consagrada norma culta-padrão Greco-Latina
Não requer floreios de retórica
Nem palavras sublimes de fúteis lisonjas

Minha poesia não usa gravata
Nem ostenta de nariz empinado ou
De salto alto, resquícios de ares palacianos
Não carrega reis ufanos e absolutistas na barriga
Muito menos fala o que quer
Por não ter nada a dizer.

Não, definitivamente, minha poesia,
E toda minha carga de emoção
Andam juntas e de mão dadas,
Jamais caberiam num mero soneto
Dois quartetos, dois tercetos: 14 versos
Não abarcam a amplitude do meu sentimento
A minha angústia, ou contentamento.

Tudo isto me parece imensurável
Enigmático, quimeras, ora bolas!
Mas não te esqueças que poesia
Tem um pouco de filosofia
E se queres de fato apreciá-las
Como bom amante do pensar
Abre uma taça do teu vinho predileto
Toma de bom grado o primeiro cálice e o
O que agora te digo:

Para apreciares a musa, não te prendas aos arcaísmos gramaticais
Nem a fórmulas poéticas pré-fabricadas
E escritas à pena e ao gosto de estilos confundíveis

Eterniza o quanto possível em teus poemas
As alegrias da vida, teus amores e paixões mais febris
Mas também registra tuas dores e tristezas
E as coisas mais banais e vãs que acaso
Julgue merecedoras de um belo poema teu
Pois estas também constituem matéria de poesia.

E quanto à filosofia, peço apenas
Que te admires um tanto mais a cada dia
Das coisas mais simples
Que povoaram e ainda povoam a tua existência
Posto que nelas encontrarás algum sentido
Para entender os mecanismos que movem e removem
Silenciosamente, imperceptivelmente...
Na calada dos teus deslizes
As engrenagens da grande e maravilhosa
Máquina do mundo!

Sê um poeta, sê um filósofo com o pouco
Que tens e com o muito que te resta saber
Mas, filósofo e poeta,
não de momento ou de ouvido, simplesmente
Mas para toda uma vida
O resto, é prontidão...

Por Francisco Neri

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